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Rádio Bandeirantes reconstitui sua história
Ademir Medici
Especial para o Diário
18/07/2000 | 20:42
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  Uma história iniciada em 1937 sacode a poeira e volta às ondas do rádio. A Rádio Bandeirantes reconstitui a sua história de 63 anos completados em maio. O Centro de Documentaçao e Memória da emissora, conhecido pela sigla Cedom, ganhou espaço nobre fora do Morumbi - onde ficam os estúdios. Funciona, agora, na moderna torre da rádio e televisao, no espigao da avenida Paulista. Uma equipe trabalha num acervo que até o início deste ano estava encaixotado.

Graças a esse projeto, o diretor de jornalismo da emissora, jornalista Marcelo Parada, anuncia: até o fim do ano, no mais tardar até o início de 2001, o programa Memória, sob o comando de Milton Parron - que coordena o trabalho de reconstituiçao histórica na emissora - voltará à programaçao.

Um levantamento preliminar do acervo sonoro da rádio contabiliza 5.696 fitas de rolo, fora os discos em 16 polegadas, gravaçoes em DAT e em MD. Muitas das fitas estao gravadas dos dois lados e boa parte delas em rotaçao muito baixa.

Isso significa que o conteúdo de horas gravadas de programas, noticiários, comerciais, novelas, músicas e shows têm o dobro e até o triplo da capacidade original. Calcula-se que a Rádio Bandeirantes tenha entre 10 mil e 12 mil horas gravadas.

Para ter acesso instantâneo a esse banco de dados que ilustra a própria história paulista e brasileira dos últimos 50 anos, pelo menos, a Bandeirantes desenvolve um projeto subdividido em três etapas: 1ª) a organizaçao do espaço físico, já concluída; 2ª) o levantamento do acervo, parcialmente concluído; 3ª) o tratamento do acervo, sua informatizaçao, reproduçao em CDs e interligaçao com os terminais de cada editoria na redaçao - este um trabalho lento e delicado, pois envolve a recuperaçao de fitas que o tempo encarregou-se de oxidar.

Os primeiros resultados técnicos têm apresentado bons resultados. Optou-se pelo acervo artístico. A vida e obra de cantores e compositores como Adoniran Barbosa, Amália Rodrigues, Isaurinha Garcia, Rita Pavone, Zé Keti e mais três dezenas de nomes nacionais e internacionais já podem ser acompanhada via computador. Entretanto, a consulta destas informaçoes ainda nao foi aberta ao público.

Concluída a parte artística, virá a esportiva. Depois o noticiário, as entrevistas, os shows de auditório dos antigos estúdios da rua Paula Souza, as radionovelas, os programas sertanejos, os comícios políticos.

Tudo isso informatizado permitirá o acesso em segundos do som desejado: o depoimento do cantor, a narraçao do gol histórico, o trecho de um noticiário dos anos 50, a reproduçao de um comercial das Casas Pernambucanas dos anos 60, o contato com trechos de uma novela levada ao ar no fim dos anos 40.

Hoje, a tecnologia disponível permite a transmissao dos dados armazenados com muita qualidade. A nova torre é interligada ao Morumbi com fibra ótica. Modernos equipamentos recuperam toda esta carga de conhecimentos jornalístico, artístico, histórico.

A garantia de que o projeto nao será interrompido é dada pelo próprio diretor de jornalismo. Marcelo Parada, filho de um antigo redator e produtor da casa, Gonçalo Parada, de um lado investe numa programaçao essencialmente jornalística.

Conjuga os grandes nomes da emissora (José Paulo de Andrade e Salomao Esper, para citar dois craques das manhas e madrugadas da emissora) com as novas geraçoes de jornalistas, entre os quais um andreense formado pela Metodista, Anderson Afonso. De outro lado, volta olhos para a história da rádio nao como mero exercício nostálgico, mas pensando na sua utilidade como ferramenta de trabalho.

Com todos estes ingredientes, seria lógico que a Bandeirantes nao descuidasse da sua memória. Daí o entendimento com Parron, um dos pioneiros dos programas de memória na rádio de Sao Paulo, desde os tempos da Jovem Pan.

Parron entrou de cabeça neste novo trabalho, formou uma equipe que atua oito horas por dia na tarefa de recuperar fitas, dar manutençao a máquinas fora de moda, juntar fotos antigas, valorizar os enormes microfones volantes que acabavam com a coluna vertebral de repórteres que corriam nos gramados atrás de uma palavra de Leônidas, Baltazar e Pelé. Ou seja: um respeito pelo trabalho de radialistas e operadores de ontem.

Parron reencontrou-se nesse trabalho. Os arquivos sempre o fascinaram, tanto os de rádio como de TV, cinema e mídia impressa: "Gosto de reviver momentos, nao apenas por saudosismo. É porque encontro muita explicaçao para coisas que estao acontecendo hoje. Só cotejando o hoje com o ontem você consegue apontar verdades".

Parada, no cotidiano da Bandeirantes, costuma dizer que a equipe nunca pode ter a arrogância de achar que a emissora está começando agora: "É claro que você nao pode ficar parado no tempo. Mas se você nao tiver consciência e nao valorizar o trabalho que foi feito pelos antigos funcionários, você acaba perdendo um pouco a noçao das coisas. A Rádio Bandeirantes só existe hoje porque levas de grandes profissionais passaram por ela".

A equipe do Cedom é pequena, mas competente. Aos 30 anos, Clednei Vergara Mendonça, o Gaúcho, que divide o seu expediente na Bandeirantes com a unidade Uniban de Sao Bernardo, é mais que um operador. Faz este papel clássico de uma emissora de rádio, mas avança. Recupera preciosidades sonoras com o amor de um pai por um filho.

Dois estudantes de jornalismo, Paula Marinho, 21 anos, e Estevan Ciccone, 20, ambos no terceiro ano da Fiam, completam o time.

E vao convivendo com personalidades que um dia dominaram os mundos dos negócios, da política, dos esportes, da sociedade paulista e brasileira.

Sao os personagens cujas vozes e pensamentos sobrevivem à segunda metade do século XX para chegar ao século XXI. Acervo da Bandeirantes? Mais do que isso, acervo de um Brasil que vai descobrindo a sua memória.




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