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Relíquias em quadrinhos

Banca Mikei, localizada na Rua Gertrudes de Lima, em Sto.André, se especializou em história em quadrinhos

Jaque Corrêa
Especial para o Diário
01/02/2024 | 07:00
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Claudinei Plaza/DGABC

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Há 26 anos, um pai e seu filho, depois de terem desistido de manter uma lotérica por questões de segurança, conheceram um senhor, o seu Delson, dono de um sebo chamado Banca Mikei, empreendimento que começou em 1972, quando o homem trocava periódicos, revistas e quadrinhos em frente à estação de trem Prefeito Celso Daniel, em Santo André. Assim, Milton João Kairof, que na época tinha 46 anos, e Rafael Cresoni Kairof, que tinha 16, embarcaram nessa jornada juntos e começaram a trabalhar no que hoje é um sebo conhecido nacional e internacionalmente por seu acervo histórico e diversificado de histórias em quadrinhos. 

Rafael, que hoje tem 41 anos, foi quem decidiu especializar a banca em HQs. Apesar de também serem vendidos LPs, DVDs, livros e revistas das décadas de 1990, 1970, 1960 e até 1920, definiu em 2010, essa transição. “A gente identificou essa mudança de comportamento de mercado, os quadrinhos vinham em ascendência, principalmente por causa dos filmes da Marvel, que fez essas histórias ficarem muito mais visíveis. Então, a gente ampliou o quadrinho e diminuiu as revistas, o que fez com que hoje a banca virasse uma referência nacional quando se diz respeito à quadrinhos principalmente”, explica Rafael. 

Atualmente, a Banca Mikei conta com clientes da Alemanha, Japão, Estados Unidos, e também de outros estados brasileiros, como o Acre. Milton e Rafael veem a loja como um memorial de preciosidades, com marcas de outras épocas, onde preservam itens que guardam histórias de seus antigos donos, “A gente guarda muita história, e a banca meio que tem um diferencial de outros lugares. A Banca Mikei, eu falo que é uma loja feita pelos próprios clientes, a gente só tá aqui gerenciando, administrando e ordenando tudo, mas é o próprio cliente que monta a banca”, observa Rafael. 

Além da sua importância cultural, o sebo marcou vidas, como a de Marcel Melinsky Kosugi, 35 anos, nascido e criado em Santo André, hoje colecionador e pesquisador de HQs, e iniciou sua trajetória no universo das histórias em quadrinhos pela Banca Mikei. 

“Faz 24 anos que leio, minha mãe e minha avó compravam quadrinhos para mim pelo fato de eu detestar ler na minha infância, já que era disléxico e tinha muita dificuldade com leitura, os quadrinhos foram essenciais para eu poder ultrapassar essa barreira”, explica o colecionador. “Então comecei a frequentar o sebo na época, pois os quadrinhos usados eram bem mais baratos que os quadrinhos de banca, assim virou um ritual, toda semana eu e meu amigo Aislan saímos do colégio na sexta e gastávamos o dinheiro que economizamos do lanche da semana inteira para comprar quadrinhos.”

O sebo se tornou também uma alternativa dos colecionadores de histórias em quadrinhos, ou novos leitores para driblar os preços das editoras, ou acharem algum item raro no acervo. “Infelizmente o hobby de ler quadrinhos ficou bem caro e hoje a maioria dos colecionadores que convivem comigo só pega quadrinhos em pré-venda ou no lançamento se realmente quer muito aquela edição. Os demais nós esperamos alguma promoção com um desconto considerável ou buscamos em sebos e grupos de vendas”, comenta o pesquisador. 

No início de 2018, houve no meio de comunidades de leitores um boicote à editora Panini Comics pelo seu reajuste de preços em sua linha de histórias em quadrinhos, Marcel observa o principal problema que segmento vem sofrendo: “Eu acho alarmante a forma como o mercado de quadrinhos vem se configurando, não apenas devido ao aumento expressivo de preços, mas também pelo fato de as editoras optarem por formatos mais caros atualmente, como os Omnibus e os encadernados de capa dura. Isso não apenas elitizou os quadrinhos, mas também dificultou a entrada de leitores mais jovens nesse universo.” 

Rafael vê essa mudança nos preços das HQs como uma consequência dos próprios consumidores: “Eu falo que o quadrinho nunca foi um item tão barato, o que muda é que as pessoas tinham, talvez, um pouco mais de poder de compra, então conseguiam comprar quadrinho mais fácil ali nos anos 1990. Aí vem o que a gente chama de gourmetização dos quadrinhos, isso é um processo recente que vem de 2015 em diante, onde as pessoas começam a conhecer mais os quadrinhos de capa dura, e muitos nem precisavam sair de capa dura. Então o próprio público acabou fazendo com que o preço dos quadrinhos subissem, mas não só isso, óbvio”, avaliou. 

Hoje a loja, que está localizada na Rua Gertrudes de Lima, conta com mais de 150 mil artigos, e além de vender e trocar, guarda itens para deixar em exposição, que fazem parte do acervo permanente, como uma revista Cruzeiro de 1962 com a Marilyn Monroe, uma revista carioca de 1939, uma edição histórica do romance Capitães de Areia, de Jorge Amado, um projetor e um editor de vídeo oito milímetros, e a edição número 1 de Turma da Mônica. “Temos a Turma da Mônica número 1 de maio de 1970. É o nosso grande triunfo.” conclui Rafael. 




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