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Ex-musa da Fórmula 1 procura emprego
Nelson Cilo
Especial para o Diário
10/07/1999 | 20:17
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Imaginem se Maria Helena Fittipaldi, 51 anos, nao fosse tao conhecida... Pois bem, acreditem: a ex-senhora Emerson só pede uma chance para entrar no mercado de trabalho. A ex-musa do circo da F-1 compoe a fria estatística dos mais de 10 milhoes de desempregados deste país. Ela, que nunca recebeu pensao alimentícia do bicampeao de F-1, luta para sobreviver.

Maria Helena é presidente da Associaçao das Mulheres Pilotos de Automobilismo Competitivo (Ampacom), mas jura que nao ganha nem um tostao na entidade criada recentemente para promover a categoria Corsa.

Quase em tom de apelo, ela sugere que esqueçam o sobrenome famoso e confiem na experiência profissional de quem fala fluentemente cinco idiomas. "Preciso de dinheiro para pagar minhas contas no fim do mês", reclama.

Na entrevista exclusiva que concedeu ao Diário, Maria Helena ainda revela a curiosidades dos tempos em que circulava nos bastidores dos autódromos. "Aquele circo era fantástico. Vivi tudo aquilo de perto", lembra. Agora, a ex-musa da F-1 inicia um ambicioso projeto destinado a revelar talentos femininos para o automobilismo.

Maria Helena jamais pensou em eliminar o sobrenome Fittipaldi. "Me orgulho dele. Seria impossível apagá-lo. Nao teria como. É como se fosse a primeira transa ou o primeiro beijo", diz ela, que procura esquecer o último dia e a última noite do casamento.

DIARIO - Você e o Emerson foram casados durante 13 anos. Como você vive hoje?
MARIA HELENA - Sou presidente da Associaçao das Mulheres Pilotos de Automobilismo Competitivo. Nao ganho nada lá. O projeto da Corsa feminina é uma coisa mais a longo prazo. Estou desempregada. Aliás, procuro emprego. Se souberem de algum emprego, me avisem...

DIARIO - Nao ganha nada, mas acredita no projeto?
MARIA HELENA - Levo muita fé. Acordo às seis da manha. Vou até a hora em que eu capoto... Me dedico feito uma louca. Que desafio...

DIARIO - Mas emprego que é bom você nao encontra?
MARIA HELENA - Infelizmente, é uma dura realidade. Este país está numa situaçao precaríssima. Milhares de pessoas estao desempregadas. Aí estranham: até ela, ex-mulher do Emerson Fittipaldi?

DIARIO - Você pretende atuar em que área do mercado?
MARIA HELENA - De preferência, em assessorias.

DIARIO - Pra ganhar quanto? Você precisaria de quanto?
MARIA HELENA - Isso nao importa. Poderíamos conversar. Mas quero ter um salário fixo. Assim, eu poderia programar meu orçamento e pagaria normalmente minhas contas no fim do mês.

DIARIO - O Emerson nao lhe paga pensao alimentícia?
MARIA HELENA - Nao, nao. Quando nosso casamento acabou, abri mao de tudo. Fiquei independente dele. Me casei de novo e voltei a me separar. Meu segundo marido era lá da Africa do Sul. Mas, graças a Deus, meus filhos foram bem amparados pelo pai. Nisso aí nao posso reclamar.

DIARIO - Puxa, ele nao lhe deu nem um tostao?
MARIA HELENA - Decidimos numa boa que seria assim. O Emerson cuidaria das crianças. Ele é um pai fantástico. Sou a primeira a reconhecer. Se o nosso casamento nao deu certo, paciência. Como pai e amigo, tudo bem...

DIARIO - Você só pede uma chance para trabalhar...
MARIA HELENA - Sim, claro. Eu acho o seguinte: tenho saúde, falo e escrevo fluentemente cinco línguas: inglês, francês, espanhol e italiano, além do português, lógico. Também entendo um pouquinho de alemao.

DIARIO - Você enfrenta uma verdadeira peregrinaçao?
MARIA HELENA - E como enfrento... É difícil, muito difícil. Como já disse: nao busco um emprego que me dê comissoes. Aqui no Brasil, é tudo muito instável. Quero ver meu salário no fim do mês.

DIARIO - Você nao contou quanto pretende ganhar.
MARIA HELENA - Nao, isso aí nao. Nao que eu... Ah, sabe o que é? As pessoas vao pensar: ah, porque é a Maria Helena Fittipaldi... Eu nao imagino nenhum exagero de salário. Nao é isso. Só quero pagar minhas contas.

DIARIO - O Emerson te deixou algum patrimônio?
MARIA HELENA - Nao, isso é outra coisa... Nao importa. Eu preciso de dinheiro pra sobreviver. Nao tenho medo de trabalhar. Visto a camisa.

DIARIO - Chegaram a considerá-la uma espécie de musa do circo da F-1...
MARIA HELENA - Aquele circo era fantástico. Eu vivia tudo aquilo de perto. Hoje, sou apenas uma ex-musa que procura emprego e nao acha...

DIARIO - A musa de óculos escuros e de chapéu...
MARIA HELENA - Eram coisas que eu precisava usar. Quer dizer, pintou essa moda. A aba do chapéu cobria meu cronômetro digital no sol. De repente, virou moda. E todo mundo falava do negócio do chapéu.

DIARIO - Apesar do sobrenome famoso, desempregada.
MARIA HELENA - Pois é. Desempregada. Imagine se eu nao fosse tao conhecida.

DIARIO - Você e o Emerson se conheceram na F-1?
MARIA HELENA - Nao, nao. Bem antes da Fórmula 1. Ele acabava de sair da Fórmula 3 para ingressar na Fórmula 2. Isso em 1969. Ou melhor, em 1968. Ele havia conquistado um título na Inglaterra.

DIARIO - Nao se conheceram no circo da F-1?
MARIA HELENA - Nao, nada. Nada a ver. Eu nem sabia quem era o Emerson. Eu trabalhava no aeroporto. No balcao de uma companhia aérea inglesa, a British United Airways. Eu me revezava entre Congonhas e Viracopos.

DIARIO - Entao, logo começaram a paquerar?
MARIA HELENA - A Susy, mulher do Wilsinho (Fittipaldi) e mae do Christian, mandava umas cartas pra Inglaterra porque o Wilsinho estava lá. Ela pedia que os passageiros levassem as cartas. Ficamos amigas. Um dia, o Emerson estava no aeroporto. Aí fomos apresentados.

DIARIO - Do namoro ao casamento, foram...
MARIA HELENA - Só quatro, no máximo seis meses de namoro. Aí nos casamos na Inglaterra. Sou filha de inglês. Ficamos lá quase um ano. Depois, mudamos para a Suíça. Permanecemos 12 anos lá. O Emerson já corria na F-1.

DIARIO - Mais do que nunca, uma carreira bem-sucedida.
MARIA HELENA - Sim, até que em 1982 apareceu a Copersucar criada pelo Emerson e pelo Wilsinho. Quer dizer, a ascensao e a queda na vida deles. Os dois nao tiveram culpa. O governo nao ajudou.

DIARIO - Aliás, um empreendimento corajoso.
MARIA HELENA - Muito, muito. Infelizmente, o Brasil nao soube apoiar. Neste país acontecem umas coisas que nao dá pra entender. Dou um exemplo: o Emerson sempre representou bem o nome do país, mas nunca recebeu qualquer homenagem.

DIARIO - Ele reclamava?
MARIA HELENA - Nao, nao reclamava. Mas eu acho que ficava chateado. Se eu fosse ele, nem voltaria mais ao Brasil. O Emerson deu muitas alegrias aos brasileiros. Nos EUA, o Emerson é nome de rua.

DIARIO - Você também começou a acelerar forte...
MARIA HELENA - No ano passado, participei de quatro etapas como piloto da Fiat Uno. Atualmente, me ocupo da Corsa feminina. Mantemos umas 100 associadas na Ampacom. Vinte delas disputam provas competitivas.

DIARIO - Aponte as melhores pilotos do Brasil?
MARIA HELENA - As atrizes Suzane Carvalho e Patrícia de Sabrit, Cristina Rosito (considerada a melhor piloto do país), Juliana Carrera, Mara Feltri, Valéria Zopello, Danusa Moura, Tatiana Bandeira e muitas outras.

DIARIO - Como é que se começa o aprendizado?
MARIA HELENA - As candidatas devem se inscrever na Ampacom (3742-0668). As meninas farao um curso de pilotagem na escola do Beto Manzini. Só depois disso é que vao às pistas. A idade mínima exigida é 16 anos.

DIARIO - Inicialmente, quais as maiores dificuldades?
MARIA HELENA - O machismo dos caras (pilotos) que, inicialmente, rejeitavam a presença das garotas nas pistas como se elas fossem rivais.

DIARIO - Nada de assédio ou cantadas, só preconceito?
MARIA HELENA - Só machismo e preconceito. Nada de assédio ou de cantadas.

DIARIO - Até que surgiu uma convivência pacífica...
MARIA HELENA - Sim, acabou a resistência. Eles perceberam nossa seriedade. Passaram a nos respeitar.

DIARIO - Quem é que dá retaguarda à Ampacom?
MARIA HELENA - Até agora, asseguramos fortes parceiros que nao liberam dinheiro, mas oferecem outros tipos de apoio. Cito: General Motors, Pirelli, Cofap, Selenia, Instituto Mauá, Rodas Binno, Transportadora Gabardo de Porto Alegre, Filadélfia, Confederaçao Brasileira de Automobilismo... Sao empresas que acreditam muito no projeto da Corsa feminina.




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